Há 50 anos, a Campanha da Fraternidade (CF), sugere que a caminhada quaresmal da Igreja Católica no Brasil seja marcada pelo apelo à conversão concreta numa tradução atual das palavras de Jesus: “tive fome…tive sede…estava nu..na prisão..”(cfr. Mt 25, 35-36). O Cristo, ao querer identificar-se com os grandes sofredores da história, quis também ser encontrado, ao longo dos séculos, no rosto marcado pela dor. É o seu incômodo disfarce, como dizia Teresa de Calcutá.
A cada ano se propõe uma temática que expressa um apelo forte ao amor do cristão e ao seu compromisso na sociedade. Neste ano o tema proposto é Fraternidade e Tráfico humano e o lema: “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5, 1).  Trata-se de uma problemática tão atual que o próprio Papa Francisco, já nos primeiros meses de Pontificado, denunciou: “o tráfico de pessoas é uma atividade ignóbil, uma vergonha para as nossas sociedades que se dizem civilizadas!” Enquanto engaja o cristão no seu compromisso com o outro, a CF pretende também chamar a atenção de toda a sociedade para uma chaga que precisa encontrar o remédio da atenção e de políticas públicas claras e eficazes para sanar essa situação clamorosa em sua raiz.
A CF visa reforçar a consciência sobre o estado da questão, a prevenção, a denúncia e o repúdio dessa atividade ilegal, além de apelar para o Estado e para toda a sociedade a fim de que se empenhem em coibir essa prática iníqua. Nesse sentido a Igreja católica no Brasil possui uma história de mobilização de várias pastorais sociais no combate contra o tráfico humano e a CNBB criou, em 2008, dois grupos de trabalho para articular os esforços das pastorais em âmbito nacional.
No Brasil, o tráfico humano tem formas bem conhecidas: a exploração no mercado do sexo, que atinge principalmente mulheres, mas também crianças e adolescentes, e a exploração de trabalhadores escravos em atividades produtivas. A Organização Internacional do Trabalho estimou que em 2012 as vítimas do trabalho forçado e exploração sexual chegavam a 20,9 milhões de pessoas em todo o mundo. O tráfico laboral representa 78% e o sexual, 22%; o número de homens é maior, 74%, o das crianças, 26%, e o de mulheres, 55%. Os traficados de países da América Latina chegam a 9% das vítimas, uma prevalência de 3,1 casos por mil habitantes.
A CF quer, assim, provocar os cristãos a darem uma resposta de amor perante uma situação concreta de atentado à dignidade da pessoa humana. O tráfico humano não é apenas uma questão social, mas também representa um desafio às pastorais e a cada cristão, em particular. O compromisso do cristão com o outro encontra sua razão primeira no olhar novo que a fé dá sobre a realidade do ser humano: todos são filhos e filhas do mesmo Pai, irmãos em Jesus Cristo. E o que se faz a um desses pequeninos, faz-se ao próprio Jesus (cf. Mt 25, 31-46)

D. Gilson Andrade da Silva
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de São Salvador – BA

LITURGIA DIÁRIA