O “sim” da Virgem ao anúncio do Anjo insere-se na realidade concreta da nossa condição terrestre, em humilde obséquio à vontade divina, de salvar a humanidade não da história, mas sim na história. Efetivamente, preservada imune de toda a mancha de pecado original, a “nova Eva” beneficiou de maneira singular da obra de Cristo como perfeitíssimo Mediador e Salvador. A primeira a ser redimida pelo seu Filho, partícipe na plenitude da sua santidade, Ela já é aquilo que toda a Igreja deseja e espera ser. É o ícone escatológico da Igreja.
No livro do Apocalipse no capítulo 12 nos diz: “Apareceu em seguida um grande sinal no céu: uma Mulher revestida de sol, a lua debaixo dos seus pés e na cabeça uma coroa de doze estrelas – O sol, a lua e as estrelas (v.1) possuem um significado simbólico e indicam que Maria participa do que é divino. O número 12 representa o povo de Israel, figura do novo povo de Deus. O parto da mulher referido no v.5 – “Ela deu a luz um Filho, um menino, aquele que deve reger todas as nações pagãs com cetro de ferro. Mas seu Filho foi arrebatado para junto de Deus e do seu trono” refere-se ao Messias. A mulher que dá a luz no v.14 –“mas à mulher foram dadas duas asas de grande águia, a fim de voar para o deserto, para o lugar de seu retiro, onde é alimentada por um tempo, dos tempos e a metade de um tempo, fora do alcance da cabeça da serpente” – pode ser vista como Maria na sua missão de Mãe espiritual: Igreja.
Uma interpretação eclesiológica e mariológica que se dá ao texto, estabelece um paralelo: no Calvário, está Maria com conotação eclesiológica; no Apocalipse, está a Igreja com conotação mariológica. Os padres da Igreja vêem aí Maria, outros a Igreja. No texto se pode ver uma cooperação de Maria universal, integral (plena contribuição e doação) e subordinada/dependente. Ela aparece também como co-redentora: não é título novo, mas não muito usado por razões ecumênicas. Maria cooperou com os seus méritos e seu consenso. É uma cooperação imediata, pois Cristo é o único, o principal, o necessário, autosuficiente. Maria cooperou de maneira imediata sendo redenta em antecipação. É também uma cooperação mediata, enquanto que Maria coopera com os outros redentos à redenção subjetiva. É uma cooperação imediata passiva pois Maria recebeu “por primeira” os frutos da ressurreição do Cristo e tornou possível os feitos da mesma. Ela aparece aí também como medianeira de graças. Cristo é o único mediador (cf. 1Tm 2,5-6). A mediação de Maria não diminui a de Cristo, mas mostra sua eficácia (Lumen Gentium 60). É uma mediação ligada à maternidade – porque foi dada como Mãe. Ela contribui a unir a Igreja terrestre à celeste.
“Maria é honrada pela Igreja com um culto especial, pois foi exaltada pela graça de Deus sobre os anjos e sobre os homens” – LG 66. A dignidade de Mãe de Deus está na raiz do nosso culto de louvor à Virgem, já que essa dignidade condensa a suma de sua grandeza.
Dom José Palmeira LESSA
Arcebispo de Aracaju