Andando pela Praça São Pedro, penso nos milhões de pessoas que adorariam ter uma conversa com o Papa Francisco. Tive por anos este raro privilégio. Em Buenos Aires eu costumava conversar com ele, às vezes mais de uma vez por dia. Hoje os contatos são menos frequentes, mas ele conserva o frescor da proximidade e da amizade adquirida ao longo dos anos; ele não mudou neste aspecto… Ouvi-lo é particularmente interessante…

 

A primeira coisa que quero perguntar ao senhor é: o que mais o atrai no seguir Jesus…

 

Não consigo expressá-lo verbalmente. O que posso dizer é que, quando estou em sintonia com Ele, sinto-me em paz, sinto-me feliz. Quando não o sigo, porque estou cansado, porque lhe fixo um horário determinado ou um limite de tempo, sinto-me insípido. É como se eu já estivesse cheio da minha vida… Alguém me disse uma vez: “Deus lhe dá liberdade, Ele sempre lhe dá liberdade, mas uma vez tendo conhecido Jesus, você perde a liberdade”. Isso me colocou em crise. Não sei se a pessoa perde ou não, mas a maneira como o Senhor o chama e estabelece um diálogo com você o faz dizer “não, não vou a nenhum outro lugar, isso é suficiente para mim”. Assim, sinto esse equilíbrio no bom senso da palavra, não psicológico, de paz, mesmo naqueles momentos de grande desequilíbrio devido a situações difíceis de enfrentar.

 

Naquele confessionário da paróquia de São José de Flores, o senhor pôde discernir sua vocação: o que sentiu de especial naquele chamado?

 

É curioso porque, depois daquela experiência de 21 de setembro, continuei minha vida sem saber o que ia fazer. Mas havia algo diferente que estava lentamente se impondo. Eu não saí de lá para ir para o seminário… Passaram-se três anos. É como um processo que muda suas orientações, suas referências. O Senhor entra em sua vida e a rearranja. E sem tirar-lhe a liberdade. Eu nunca tive a sensação de não ser livre.

 

O senhor continua se definindo como um “padre”: do que o senhor mais gosta da vocação sacerdotal?

 

Estar à serviço. Uma vez um padre me disse – ele vivia em um bairro muito pobre, não em uma favela, mas quase, e tinha sua casa paroquial ao lado da igreja – e me contou que quando ele tinha que fechar a porta, as pessoas batiam na janela. Então ele me dizia: “Eu gostaria de fechar aquela janela porque as pessoas não deixam você em paz”. As pessoas não o deixam em paz. E por outro lado, ele me dizia que se fechasse a janela, não ficaria tranquilo, mas muito pior. Porque quando você entra no ritmo do serviço, se sente mal quando toma uma fatia de egoísmo para si mesmo. A vocação para o serviço é um pouco assim, você não pode imaginar a vida se não estiver à serviço. Eu não trocaria ser padre por nada, depois da experiência de ser padre. Com limitações, com erros, com pecados, mas padre.

 

O que o senhor diz aos padres?

 

O que eu digo a um padre é “seja um padre”. E se não funcionar para você, procure outro caminho, a Igreja abre outras portas para você. Mas não se torne um funcionário. Gosto de dizer o seguinte: seja um pastor do povo e não um clérigo de estado.

 

Como o senhor percebe a fraternidade entre os cardeais?

 

A longo prazo, há uma proximidade. Eles podem ter opiniões diferentes, mas a coisa positiva é que lhe dizem o que pensam. Eu tenho receio de agendas escondidas. Quando se tem algo e não se diz. Agradeço a Deus que no Colégio cardinalício haja comunicação, tanto entre os novos como entre os mais velhos, e que eles tenham a liberdade de falar … Não sei se todos eles, mas muitos têm. Às vezes “Ei, tenha cuidado com isso”, “olhe… “. Ah, obrigado. Vou pensar nisso e depois resolvo, lhe digo como … ou eu não lhe dou ouvido, lhe digo: olhe, não lhe dou ouvido por causa disso, disso e disso. Mas o diálogo é aberto.

 

O senhor tem suas devoções. Aqui está este quadro de Nossa Senhora que desata os nós, uma devoção que adquiriu na Alemanha. Pode nos dizer por que sempre a enviava como cartão devocional em seus envelopes?

 

Eu nunca fui ao lugar onde está a imagem original. Aconteceu que uma freira alemã a enviou para mim como uma saudação. Eu gostei. Comecei a ter uma devoção a esta imagem na Argentina. A história é bonita, o quadro não vale muito, é do baixo barroco do século XVIII, já decadente. Um pintor da época que insultava a esposa. Eles eram muito católicos, mas discutiam todos os dias. E um dia ele leu o texto de Santo Irineu de Lyon, segundo o qual os nós que nossa mãe Eva tinha atado com seu pecado eram desatados por nossa mãe Maria com sua obediência. O Concílio o tomou e o incluiu, creio, na Constituição sobre a Igreja. Ele gostou e assim pediu a Nossa Senhora que desatasse o nó que tinha com sua esposa porque eles não se davam bem. E é por isso que, abaixo, retrata o arcanjo Rafael com Tobias levando-o para encontrar sua noiva, sua esposa, para conhecê-la. A Virgem realizou o milagre e tudo começou a partir daí. Eu tomei a devoção. Augsburg é a cidade. Na Igreja de São Pedro em Perlach. Eu nunca fui lá, estava perto dali, em Frankfurt. Mas isso foi o suficiente para mim, e a devoção começou na Argentina. É como se Nossa Senhora fosse capaz de ajudá-lo, como diz o texto de Santo Irineu, de ajudá-lo a desbloquear as coisas.

 

A desatar os nós da vida…

 

É a “maternidade” de Nossa Senhora.

 

E no que diz respeito a São José?

 

Foi minha avó que colocou São José na minha cabeça… Quando criança ela me fazia recitar orações a São José. A devoção permaneceu.

 

O senhor também tem uma pequena imagem de São José dormindo. Nela são colocadas intenções especiais…

 

Quando me pedem orações, eu as coloco debaixo da imagem. Eu digo: “Tu que dormes, resolve os problemas”.

 

E Santa Teresinha?

 

Santa Teresinha sempre me atraiu… A coragem da pessoa comum. Se me perguntarem que coisas extraordinárias Santa Teresinha tinha: nenhuma. Ela era uma freira pobre e normal. Em seus últimos dias ela também sofreu as maiores trevas, as maiores tentações contra a fé, ela passou por todas elas. Uma mulher normal.

 

Para terminar, peço ao senhor algumas breves mensagens. A primeira mensagem é dirigida às crianças:

 

Cuidem dos avós. Falem com os avós. Visitem os avós. Deixem que os avós as encham de mimos.

 

Aos jovens…

 

Não tenham medo da vida. Não fiquem parados. Avancem. Vocês cometerão erros, mas o pior erro é ficar parado, então sigam em frente.

 

Aos pais e às mães…

 

Não desperdicem o amor. Tomem conta um do outro, assim poderão cuidar melhor de seus filhos.

 

Aos doentes…

 

Ah, isto é difícil porque aconselhar a paciência é fácil, mas eu não a tenho, portanto, entendo quando vocês ficam um pouco irritados. Peçam ao Senhor a graça da paciência e Ele lhes dará a graça de suportar tudo isso.

 

Por fim, aos idosos, dos quais o senhor fala tão frequentemente…

 

Aos idosos: não se esqueçam de que vocês são as raízes. Os idosos devem transmitir isto às crianças e aos jovens. Aquele versículo do Livro de Joel: qual é sua vocação como ancião, os idosos terão visões e os jovens farão profecias. Quando estão juntos, os idosos sonham com o futuro e o transmitem, e os jovens, apoiados pelos idosos, são capazes de profetizar e trabalhar para o futuro. Juntamente com os jovens, não tenham medo de nada. Um idoso amargurado é muito triste. É pior do que um jovem triste. Portanto, sigam em frente, estejam junto com os jovens.

 

Fonte: Guillermo Marcó – Infobae / Vatican News

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